terça-feira, julho 12, 2005

O Direito à Diferença ...

Sempre gostei de pessoas. De as ouvir, de estar e falar com elas. Sempre gostei até de pessoas de quem mais ninguém gostava. Sempre me atraíram aquelas pessoas que não se situavam na mediania, que não falavam de coisas banais só porque estão na moda.

Aceito e respeito mas incomoda-me pensar que existem pessoas que vestem, vêem, ouvem ou lêem isto ou aquilo só porque toda a gente o faz. Pessoas que acham que há uma idade para se fazer isto ou aquilo. Que vão a correr casar-se, mesmo correndo o sério risco de serem infelizes, porque têm medo de ficar para «tio(a)s», como se nós fossemos comparáveis a uma lata de feijões que perde a validade de um dia para o outro. Pessoas que olham para tudo o que os outros vestem de fio a pavio mas se esquecem de dar “os bons dias”... e outros que tais.

Lembro-me que uma das minhas maiores amigas da adolescência, com quem me recordo de meter conversa para a tentar conhecer, me chamou na altura a atenção porque toda a gente a achava antipática e esquizóide porque naquela altura, em 1983, ela se vestia tipo punk e usava um alfinete de AMA (obrigada IM...) na orelha.

Não descansei enquanto não fui ter com ela e não me arrependi. Por detrás daquelas roupas e a emoldurar aquele irreverente brinco de alfinete de AMA (obrigada IM...), escondia-se uma das pessoas mais criativas, meigas, interessantes e sensíveis que já conheci.

Cada vez menos acho que faça sentido que se ostracizem as pessoas apenas porque não fazem, não dizem, não sentem, nem pensam da mesma maneira que nós.

Conto-vos isto porque hoje, numa saída matinal para comprar o habitual bolo numa pastelaria que os fabrica divinalmente bem, à saída, e já de bolo na mão, dei de caras com um homem, dos seus quarenta e muitos anos, numa rua em pleno coração de Lisboa, a pavonear-se todo vestido de Batman. Ele era sapato com um tipo de perneira preta que subia até ao joelho, fato cinzento com a celebérrima inscrição do morceguito a preto num fundo amarelo, com direito a máscara com orelhitas e tudo e com uma capa em forma de asas pretas.

Ainda pus a hipótese de ser alguma coisa que tivesse a ver com a publicitação do filme (que, segundo creio, já estreou há alguns dias), mas o fato pareceu-me demasiado artesanal para que o que acabei de ver pudesse ascender à categoria de manobra publicitária. Ele, de facto, não estava nada com ar de quem estivesse a fazer aquilo por dinheiro. Apetecia-lhe e pronto.

Apetecia-lhe ser super herói e era mesmo. Vinha com o ar mais compenetrado do mundo e sempre que alguém olhava para ele era vê-lo a abrir as “asas” que lhe serviam de capa, numa espécie de dança nupcial que o fazia levantar os tornozelos do chão e flectir ligeiramente a cabeça para a frente em jeito de saudação.

É claro que eu, por defeito profissional e por ser uma eterna apaixonada pela observação e estudo do comportamento, fiquei a observá-lo até ele desaparecer do meu campo visual. Era fabuloso vê-lo. Não se metia com ninguém, não era malcriado, não gritava, nem falava. Sorria apenas. E passeava-se, orgulhoso na sua fatiota de super herói, como se o encarnar daquela personagem fabulosa o tornasse imune a todas as provocações e aos risos de alguns transeuntes.

Vou lembrá-lo por muitos anos. Disso tenho a certeza. Ele em mim nem sequer reparou. Se calhar é porque eu sou demasiado igual à generalidade das pessoas... ainda assim Sr Batman, foi um prazer cruzar-me consigo.

Caracol Super Herói

10 comentários:

Abelhinha disse...

Fantástico!

Imagino... esse Batman é sem dúvida um grande super herois nos nossos dias em que todos reparam em tudo!

Bem observado Caracolinha.

É por seres assim que te deixo dizer que a Inês é nossa!

Beijos muito muito melosos e com muita magia

Caracolinha disse...

Minha Linda Abelhinha, não podia deixar de vir aqui dizer-te que as tuas palavras me puseram de lagrimita no olho ...

Mas acredita minha querida que tudo o que te disse é a mais pura das verdades e que é por tu seres como és e te dares como te dás a ela que tudo na NOSSA INÊS aparece sob a mais doce forma de fantasia.

Beijo Emocionado !!!! ~:o)

Anónimo disse...

F
A
N
T
Á
S
T
I
C
O
!
!
!
!

Talvez por defeito da profissão, mas de outro ponto de vista, passo a vida a observar!!!

É bom não é?

=)

Leonor disse...

não aguento. decididamente não aguento quem julga os outros pelas aparencias e vai atrás de clichés mal fabricados. diz-se e faz-se porque...

bom! acredito que temos de dar tempo ao tempo e acreditar que as pessoas um dia vejam os outros com olhos de ver.

beijinho da leonor

Mocho Falante disse...

Pois, são os famosos juizos de valor a falar mais alto, é que confundor a pata à milanesa com a pata aqui na mesa é facilimo

Bábas

Isabel Magalhães disse...

Caracolinha,

assino em baixo. :) Cada um é como é!

Olha... o Batman já estreou, sim. E eu já fui ver. É realmente "O Princípio", uma versão muito fiel dos livros de banda desenhada do personagem.

Beijinho.

Dilbert disse...

Oi caracolinha :)
De certo modo acho que todos conseguimos ser um pouco Batman pela blogosfera... no meu caso BatDilbert, no teu Batcaracolinha :)
Pelo menos julgo que somos mais verdadeiros e iguais a nós próprios... não estamos pelo menos muito preocupados em que reparem... claro que daí até andar na rua... ainda vai uma boa dose de afirmação e coragem.
Beijos e até já...

Vespinha disse...

Felizmente que ainda há gente nesta cidade que é uma autêntica lufada de ar fresco!
Quem critica a diferença e faz disso escárnio,nem sabe o que anda a perder...
Faz-lhes falta fazerem qualquer coisa do tipo "Clube dos Poetas mortos" e olharem a vida numa perspectiva diferente.
Fazia-lhes bem a eles e a nós que já não suportamos o cinzento dos fatos e gente certinha!

Bába da Vespinha Open Mind!

SaoAlvesC disse...

muito bom este texto! gosto da forma sensível que usas para descrever as coisas que te rodeiam :)

obrigada pela visita à caixinha de pandora que afinal não tem maldades, apenas muita esperança e vontade de viver. :)

se me permites voltarei também por aqui.

Anónimo disse...

Ahahahahah! Não é obrigda a mim e sim ao Dicionário da Língua Portuguesa da Texto Editora que menciona "alfinete-de-ama"; mas já o Dicionário da Língua Portuguesa Contemporânea da Academia das Ciências, o tal do "bué" :) também menciona "alfinete-de-dama" s.m. O m. que alfinete-de-ama.
O Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa refere apenas "alfinete de bebé" = a alfinete de segurança.

Moral da história "So much a do for nothing"! :)))

Beijinhos lisos e ensonados. :)