Tá de Chuva ...

Considero-me uma pessoa minimamente inteligente. Tão inteligente que consigo perceber o peso da responsabilidade que me cai nos ombros quando me pedem para decidir seja aquilo que for ...

Não contesto, como nunca contestei, a opinião dos outros ... nem nunca deixaria que os meus argumentos se sobrepusessem aos de ninguém, da mesma forma que nunca me deixaria influenciar pelos princípios que regem a vida dos outros, afinal vivemos em democracia e isso é uma pedra basilar quando se trata de perceber que cada um tem que pensar pela sua cabeça ...

Ora, e por falar em democracia, solicitava que alguém me explicasse que raio de fenómeno é este que faz com que as pessoas se divorciem do seu papel de cidadãos e “deixem andar”... o que é que se passa com as pessoas quando volto a ouvir em programas televisivos argumentos como “o tempo de chuva também não ajudou ao referendo” - parece-me que da outra vez o sol também terá “queimado” as intenções de voto - ou seja, este referendo “afundou”. Literalmente.

E com ele afundaram-se todos os portugueses que exerceram conscientemente o seu direito de voto. Todos aqueles que realmente percebem que fazem a diferença ... e que, ao observarem que o peso da abstenção tem mais valor que o peso da consciência vivida em pleno e materializada no voto, se perguntam ... como pode ser possível que não se aprenda com os erros do passado ????

Isto porque já no passado nos pediram para decidir ... e nós, com a nosso tradicional encolher de ombros, a nossa usual inércia, o nosso tão famoso nacional porreirismo, a nossa péssima memória a médio prazo - parece-me que só somos bons para viver dos feitos dos nossos conquistadores que desbravaram os mares em busca de novas terras, aqueles que já cheiram a bafio mas que ainda fazem muita gente encher a boca a dizer que já fomos “donos do mundo - voltámos a enterrar os rabos no sofá e pusemos nas mãos do “destino”, do “fado” (essa coisa tão portuguesa) mais uma decisão tão importante como esta.

Com níveis de abstenção desta ordem, e com mais um referendo não vinculativo, pergunto: como é possível que não se considere a participação daqueles que resolveram “pôr a mão na massa” ?? porque é que não se vinculam decisões aos votos daqueles que se quiseram vincular com o seu voto e a sua participação cívica ?? como é que pode ter mais valor o “não votar” ??

Percebo claramente que, sendo um dever, o voto, não é, nem deve ser, obrigatório. Mas caraças, que valor se dá então a quem vota “sim” ou “não” ?? que papel temos nós, aqueles que calçaram as barbatanas e vestiram o fato de mergulho e se aventuraram neste dia de chuva ??

Eu não me importo nada com quem não vota, da mesma forma que acredito que quem não vota não se importa que eu vá votar ... agora, perceber que os “não votos” dos que escolheram talvez, demonstrar o seu desinteresse pelos referendos ou pela questão do aborto, com um virar de costas ao cartão de eleitor, contem para não vincular a minha opinião e a de todos aqueles que se quiseram fazer ouvir, isso é que me lixa ...

Mas, apesar de todo este desabafo ... parece-me que ... SIM ...

Fico feliz porque foi nesse quadradinho que coloquei a minha cruz e, volto a repeti-lo, não admito contestem a minha escolha da mesma forma que nunca condenei aqueles que preencheram o quadradinho do lado ... cada um pensa por si e assim é que é bonito ...

Porque quem é a desfavor do aborto continuará a fazer o seu trabalho e a apoiar as mulheres de acordo com as suas crenças e quem é a favor se encarregará de acreditar que demos um passo em frente na melhoria das condições de saúde e de assistência às mulheres no sentido de dignificar a sua condição e um passo a trás na hipocrisia e falso moralismo.

Sou portuguesa. Sou votante convicta. Não falho uma. Nem falharei enquanto puder. Porque voto. Porque decido. Posso falar.

Um beijinho aos amigos do SIM e outro aos amigos do NÃO, porque mais importante do que as coisas que nos afastam, são aquelas que nos aproximam ... é assim em democracia ... :)

Caracolinha Referendadeira