sábado, julho 16, 2005

« Já Vai .... »


Pois é, ontem o dia começou benzinho ... os planos incluíam um início de manhã desportivo, sim porque de manhã é que se começa o dia. Mas a realidade revelou um surpresa muito maior.

Acordei á hora habitual e segui o ritual de aprumo diário. Ao calçar a última das duas sandálias ali estava ele já ao meu lado, com aquele ar dengoso que tão bem sabe fazer quando quer conquistar uma ida à rua que é inteiramente sua por direito. É impressionante como ele sabe quando chega a hora de o levar a passear, e ontem não foi excepção. Disse-lhe o que digo sempre para ele refrear aquela ansiedade do xixi matinal mas qual quê ... é vê-lo de roda de mim aos saltos e a ladrar naquele tom de desafio.

E lá fomos os dois fresquinhos e cheirosos numa manhã que já deixava transparecer uma luz que estampa na cara de qualquer pessoa um sorriso rasgado.

Elevador connosco, rés do chão marcado, e ai vamos nós a toda a velocidade, nada de novo se, quase a chegar aos rés-do-chão, o elevador não tivesse parado abruptamente a meio da viagem sem chegar ao nosso destino, para nossa grande surpresa e admiração. E parou, para nosso azar, no pior sítio. Nada de ficar entre andares, não, o elevador devia querer mesmo testar a nossa resistência e, em frente a uma parede totalmente fechada que antecede a chegada ao rés do chão, apenas nos deixou uma nesguinha de uns 30 cm para ver a luz do dia ... assim que a geringonça parou o meu cão Freud olhou para mim com aquele ar que só ele tem como que a dizer: «então? Não abres a porta????»

E eu, com o corpo ainda a reagir fisiologicamente àquele contratempo, disse-lhe: «FREUD, FICÁMOS PRESOS NO ELEVADOR....!!!!», ao que ele me respondeu com um abanar intenso de cauda como se eu acabasse de lhe dizer que tinha ganho o Euromilhões.

Ainda tentei o truque do botão de STOP que já me salvou em situações de clausura menos graves que esta, mas desta vez, e para aumentar ainda mais o meu sufoco, nem sequer fez com que o raio do elevador de movesse um milímetro.

Quando dei por mim já estava de dedo colado ao botão do alarme que fazia soar uma sirene que, para minha esperança, se deveria ouvir tão bem fora como eu ouvia dentro do malfadado elevador. Mas lá largar o botão é que eu não fui capaz, era carregar a toda a força na esperança de ouvir uma voz do outro lado que significaria o caminho da liberdade.

Que bom, eram 8.30 da matina, a senhora que está encarregue da vigilância do prédio está de férias e só sobrava a outra senhora que faz a limpeza que deve perceber tanto da mecânica de elevadores como eu percebo da cozinha tradicional do médio oriente.

E o cão ali estava, sem perceber porque carga de água esta viagem de elevador estava a demorar tanto tempo. Por momentos convenci-me que ele pensou que estávamos a atravessar o centro da terra e que íamos fazer xixi à Nova Zelândia.

Percorro rapidamente a minha lista de contactos memorizados naquilo que ainda restava da minha capacidade mental e concluo rapidamente que ninguém estaria em casa àquela hora.

Ligo à minha querida Vespa (haja uma coisa boa, no elevador o telemóvel tem rede) que é a correspondência feminina do grande e saudoso MCGiver (grandes anos 80) que apenas com um canivete (que creio que nem era Suiço) desmantelava bombas e entrava nos sítios mais blindados e saia sempre com o cabelinho arranjado e sem uma única nódoa, e digo-lhe: «Ai mulher, estou aqui presa no elevador da minha casa». E ela, para meu contentamento disse-me: «daqui a nada estou ai, já vou a caminho...».

De repente, e porque ainda continuava a carregar no botão do alarme, pareceu-me ouvir uma voz do outro lado a dizer «jjjjjááááá vvvvaaaaaiiiiii....», era a senhora da limpeza que já tinha detectado o meu estado de histeria generalizada.

Oiço-a a desligar o comando do elevador e de repente as luzes apagam-se e apenas sobram as luzes de presença. Eu e o bicho ficámos na penumbra, apenas iluminados por aquelas luzes que transformavam as nossas silhuetas em esboços de um qualquer desenho.

Quando ela volta a ligar o comando do elevador, o raio do aparelho teve a mesma reacção que o George Michael teria ao ver a Angelina Jolie toda nua: nenhuma !!!!

Já tinham passado mais de 10 minutos e eu ali mais o desgraçado do Freud.

Foi ai que eu perdi o que restava do meu, já pouco, controlo ... «eu quero sair daqui, tire-me daqui...» ... quando de repente oiço, do outro lado da porta do elevador, uma voz familiar: «Óh Dona Maria, vá lá buscar a chave e abra a porta do elevador....».

Era a Vespinha, que entretanto já estava do outro lado a comandar a operação de resgate.

Assim que conseguem abrir a porta do elevador, lá me pus de cócoras e lá vi o panorama que me aguardava, pela famosa nesga de 30 cm que o elevador decidiu gentilmente conceder-me, a Vespa de mãozinha estendida para me acalmar e a D Maria de vassoura na mão. Por momentos convenci-me que a mulher me fosse dar uma vassourada por já não me poder ouvir aos berros, como que a dizer «cala-te histérica....!!!!».

A Vespa, zelosa como é seu hábito, disse logo «passa para cá o Freud...», e lá foi ele em segurança, através da nesga do elevador para as asas da Vespa que o libertou a ele e à sua bexiga. E eu, lá continuei enclausurada. A vantagem de termos grandes amigos por perto é que eles sabem sempre o que dizer nestas alturas.

De repente vejo mais uma cabecita a chegar e a juntar-se às duas que já me eram familiares. Era uma das doces vizinhas do meu andar que ao chegar fez uma pergunta absolutamente desnecessária: «Então o que é que aconteceu????»

Apeteceu-me responder-lhe: «Nada, não aconteceu nada, fui eu que me fechei aqui dentro de propósito porque sou muito egocêntrica e queria muito chamar a atenção das pessoas sobre mim !!!!» ... contei até 10 e disse-lhe: «olá, está boazinha ???? foi o elevador que parou de repente e eu fiquei aqui fechada...».

Já lá iam 15 minutos... e eu pensava que a situação não podia piorar mais... mas enganei-me quando de repente a vizinha se sai com esta pérola: «oiça lá, porque é que não tenta enfiar aqui a cabeça neste buraco ...???? é que se passar a cabeça passa o resto....».

Apesar de ela ser um doce de senhora e absolutamente prestável, convenci-me por momentos que estaria em pleno estado delirante e que me imaginava a trabalhar no Circo Chen, num qualquer número de contorcionismo rodeada por meia dúzia de coreanas... fiz de conta que não ouvi e continuei agachada à espera de uma ideia que fosse realmente digna desse nome.

Eis quando a mesma vizinha que tinha estado a alucinar há uns segundos antes se lembra de se sair com esta: «oiçam lá, isto de porta aberta é que não vai para lado nenhum, vamos pegar na chavinha e fechar de novo a porta, desligamos e voltamos a ligar o elevador e a coisa pode ser que ande...»

A Vespa concordou, a D Maria também, e eu que já nem sabia bem se isso era bom ou mau, também disse que sim, de resto já não me restavam mais alternativas.

Quando vejo a porta a fechar-se tive outro calafrio ... as luzes apagam-se de novo ... acendem-se depois e .... o elevador começou a mover-se !!!!!

Finalmente ... sou puxada em direcção ao rés do chão mas, para minha grande surpresa, a aventura ainda não tinha terminado, passo pelo rés do chão e oiço-as todas contentes a celebrar a vitoria sobre o elevador mas, com grande espanto, não paro e sou sugada para a sub-cave ... já em desespero tento abrir a porta na garagem e não consigo e, como se o elevador tivesse vontade própria, sou de novo sugada, desta vez para cima. Passo de novo por elas já aos gritos «eu não consigo abrir a porta e isto não pára....», já tinha perdido o meu amor próprio e a vergonha e gritava num misto de terror e desespero ... ai vou eu non stop até ao 12º andar, numa penada e sem ter tempo sequer de reagir ... chegada ao último andar o elevador decide ceder e eu abro a porta com a satisfação natural de quem se vê fora deste imbróglio.

Desci a pé os quatro andares até minha casa com a sensação de que tinha acabado de correr a meia maratona de Lisboa...

O reencontro com a Vespa e o Freud foi feliz, e ainda tive oportunidade para recusar gentilmente o chazinho de tília que a vizinha envolvida na operação de resgate me quis oferecer. Agradecimentos feitos, segui caminho para o dia que me esperava.

Para quem estava a pensar começar o dia com uma ida à piscina para uns momentos relaxantes de natação não estive nada mal.

Quando o sorriso voltou à minha cara, o que, para quem me conhece, sabe que não é difícil, pensei no dia bom que me esperava e no final da noite com o concerto de Xutos ... mas isso fica para outras núpcias ...

Caracol Enclausurado

19 comentários:

SaoAlvesC disse...

que terror! até estou arrepiada... ai a minha claustrofobia :P

SaoAlvesC disse...

ah... tens uma prendinha no "caixote" do costume! :) bj e bom fim de semana.

Sérgio Martins disse...

São momentos desses que fazem apreciar as coisas boas da vida. A liberdade por exemplo :) Bom fim-de-semana!

Anónimo disse...

Que história porreira!!!

Eu é que tenho pavor de elevadores!
Ando neles, mas quando ameaçam parar...fico em pulgas, nervosa, com calafrios...
Só de pensar que as cordas partem e deposi lá vou eu...
Ui...

Pfff..

Bjo!Guevara

Isabel Filipe disse...

Ui....mas que história...
foste personagem dum filme de horror...

bom resto de sábado

Bjs

wind disse...

Credo, que coisa.lololol Mas desculpa que me ri pela maneira como está escrito:) beijos e bom sábado*

Kalinka disse...

Realmente, CARACOLINHA, foi uma aventura macabra, mas com um bom fim, felizmente.
Mas, sabes k são nesses 15 minutos de pânico, desespero, ansiedade, confusão que mais parecem horas, que vamos dando mais valor às coisas mais simples da vida...
Por isso se diz:
«A vida é feita de bons e maus momentos...» concordo plenamente.
Bom fim de semana e cá fico a aguardar as outras núpcias para ler coisas mais felizes que tb acontecem na nossa vida diária!

aDesenhar disse...

podia chamar-se

odisseia num elevador
ou
terror no elevador
ou
como curar a sua claustrofobia

brrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrr

como detesto espaços apertados
....

como é bom sentir a liberdade.

:)

Abelhinha disse...

Isso é que foi o começar de um dia em grande!

Bom concerto! Que tudo corra da melhor forma possível.

Beijinhos

Anónimo disse...

Eu no seu lugar, depois dessa, não andaria mais de elevador...só nas escadas...

Dilbert disse...

Bem caracolinha... poxa... isso é que foi, hem...
Amanhã é melhor ir a pé... acho :)
Beijokas e até já...

Ultimate_pt disse...

Olá.:)
Sinceramente penso que foi uma experiência a não repetir e se fosse a ti passava a ir pelas escadas durante uns tempos...e já agora qual é que é o teu andar?
Ainda bem que as coisas acabaram bem,pois entendo como te sentiste visto que te expressas muito bem a escrever.Espero tb que o concerto tenha sido agradável.
Beijos.

CP disse...

Isso era bem era para mim...

Anónimo disse...

Olha, estou a rir alto feita parva há uns bons minutos. Tanto que já me vieram perguntar qual era a piada. HAHAHAHAHA

Ontem tb fiquei fechado no elevador da minha casa nova, mas safei-me em dois minutos.

Agora, adorei o teu relato delirante. AHHAHAHHAHHAHAHAHAHA

Sobretudo, algumas saídas como esta "deve perceber tanto da mecânica de elevadores como eu percebo da cozinha tradicional do médio oriente."... HAHAHHAHAHHAHHAHA

Espera aí que me vou rir lá para dentro! HAHAHHAHAHAHHAHHAHAHAHAHHAHHA

:D:D:D:D:D:D:D:D:D:D:D::D:D:D:D

PS - Ainda bem que não tenho claustrofobia nenhuma porque há uns anos passei 4 horas fechado no elevador até vir o "senhor técnico" :D

Isabel Magalhães disse...

Uma verdadeira "Viagem Trágico-Elevatória"! :)

Beijinho "liso".

Vespinha disse...

Foi puxadote sim!
A D. Pureza a olhar para a chave do elevador como um boi a olhar para um palácio mas sem nunca perder a postura empenhadíssima!

E o cão a esticar as patitas e a saltar-me para os braços vindo do elevador, parecia uma cena de salvamentos fantásticos que passam no Discovery Channel!

bj da Vespinha Discovey Chanel

Bastet disse...

Pobre Caracolinha! :( Também não acho graça nenhuma a ficar presa em elevadores! Brrrrrr....

Mocho Falante disse...

E depois quer a XôTôra mais não sei quantos euros para obras...su su abelhum

Ass: Mocho Odisseia

LUA DE LOBOS disse...

como o meu amigo João diria de olhos arregalados, do alto dos seus 71 anos de idade:
PORRA, PAPAGAIO!!!
xi de solidariedade
maria